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Os afetos que guardamos

  • Martha Sampaio
  • 6 de ago. de 2021
  • 2 min de leitura



Era um grupo pequeno e de idades variadas. Entre goles de memórias e de champanhe, a bomba: Como assim? Telégrafo? Telegrama? Fax? Carta? Sim, aquela escrita à mão que vinha dobradinha dentro de um envelope selado.


Nessa altura, o papo já andava mais pelo filosófico - sim, existia vida antes do advento do correio eletrônico.


“Fulana, chegou uma carta para ti.” Se você vem lá do século passado (de antes da última década), certamente já sentiu o coração crescer e crescer e crescer diante de um envelope endereçado a você. E que não obrigatoriamente continha um boleto ou uma multa de trânsito. Tente transmitir essa sensação a uma pessoa jovem, e

prepare-se para uma experiência transcendental.


Nascidos e criados no contexto da instantaneidade, é complicado para essa turma compreender que os mesmos recursos que facilitam a vida também subtraem parcelas das nossas boas emoções.


“Mas uma mensagem por e-mail ou redes sociais também é uma coisa boa de se receber.”


Verdade. Mas a distância é abissal. Uma carta percorreu quilômetros de significado e sentido até chegar a você. Alguém dedicou tempo e energia, pegou no papel e na caneta, escreveu - sem editor de texto, sem copia e cola e sem pressa -, selou o envelope, foi até o posto dos Correios e despachou uma carta para você. Especialmente para você. Vem com vida, vem com os traços e sentimentos de quem a escreveu.


Mensagens eletrônicas chegam aos milhares. Porque o percurso é fácil.


Cartas chegam com a elegância e o charme do que é singular. E eventual. Cartas vivem, podemos senti-las, tocá-las. Podemos perscrutá-las. Carta a gente guarda.

E-mail a gente arquiva. Podemos até imprimi-lo, mas e o cheirinho? Será o da tinta da impressora.


Guardo bem os meus afetos nas cartas que recebi. É muito bom, vez que outra, tocar e sentir um bocado da minha vida. Na mão.


A conversa fluía bem. Mencionei meu desapontamento quando algumas pessoas não responderam - nem mesmo com um econômico “ok, obrigado” ou um “recebido” - as mensagens que eu havia enviado no Natal. Alguém da ala jovem foi rápido e preciso: “É que são mensagens demais, é tudo muito. Nem liga, não é nada pessoal.”


Tá aí, não é nada pessoal.


Fim de papo.


Até.


 
 
 

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