O que fica é a caminhada
- Martha Sampaio
- 10 de dez. de 2021
- 2 min de leitura

Crianças, moços e velhos, tudo junto e misturado, despertam a nossa atenção para o tempo que passa, indiferente ao ritmo que escolhemos andar.
O parque respirava lindo naquela manhã. Gosto de estar ali - a luminosidade, o lago, as árvores e os aromas confundem-se com a natureza humana que circula ali. Brinco de adivinhar as histórias das pessoas que cruzam por mim. As expressões, olhares e o jeito de cada um sugerem narrativas divertidas e variadas, algumas cheias de drama, muitas de triunfo, outras, who knows?
Ela está sempre lá, altiva sob a lucidez dos cabelos brancos. O crepúsculo de uma vida que adivinho bem vivida. Deixa-se conduzir na cadeira de rodas. E o olhar reflete um contentamento sereno e fundo - grato pelo instante a mais sob o teto azul do céu.
Em direção a ela, vem a menina na velocidade de seus vinte e poucos anos. Passa feito o vento e faz roçar, na face vincada e linda, a circularidade da vida. A senhora sorri - de satisfação ou saudade, não sei - , uma reverência às andanças que já foram suas. Próximo dali, o sussurro estridente da infância remexe o ar e leva calor e promessas por todos os cantos.
O parque é generoso. Abraça uma diversidade grande de memórias, realidades e perspectivas. Esperanças e cansaços também encontram refúgio ali - e é fácil adivinhar que pouco têm a ver com a idade de cada um.
Dou voltas e mais voltas pelos meus pensamentos. E esbarro com a lembrança de um grande amigo, meu pai. Percorreu a vida com uma pegada firme e leve. Podia perder a parada, mas nunca o ritmo. Um teimoso incorrigível - nada o fazia desviar do apreço, do respeito e do amor pela caminhada. Num aperto qualquer, lá vinha ele: “Devagar (!), o mundo não vai acabar amanhã.”
O tempo passa e passa e passa. E zomba da nossa pressa. E passa. Na ânsia de ser e de alcançar e de fazer e de chegar, é fácil esquecer o quanto é importante dar um respiro e um mínimo de amor aos próprios passos.
Até.
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